quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Dialogando com filhos
Diálogo 1

"Minha mãe diz que nós viemos aqui para nos sentirmos melhor. Meu pai diz que viemos aqui por que temos que vir".
"Por que você não fala sobre isso com sua mãe?"
"Se eu conto para minha mãe, ela liga para o meu pai e eles brigam.Eu não quero que eles briguem. Não quero que seja minha culpa."
"O que seria sua culpa?"
"Eles se divorciarem.Tudo o que eu faço só piora a situação"

Diálogo 2
"De novo, não sei o que fazer, meu aniversário tá chegando e é sempre a mesma história!"
"Qual história?"
"Eu tenho que fazer dois, na verdade, três aniversários, se quiser que todo mundo fique bem. Um pra minha mãe ir. Outro para meu pai e a mulher dele. E outro pra mim, (risos) com meus amigos".
"Por que tantos??"
"Porque um não quer estar onde está o outro. E ficam chateados se não faço um pra cada um."
"E o seu?"
"Ah, esse é pra eu me divertir!!!!"
"Quantos anos vc vai fazer?"
"28"
"Mesmo? E quantos anos você tinha quando seus pais se separaram?"
"4".

Poderia contar pra vocês mais algumas dezenas de diálogos como esses que tenho presenciado no meu consultório durante meus anos de prática. Não farei isso. Convido aos leitores a lembrar todos os que já presenciaram e viveram. Convido também à reflexão sobre as situações de divórcio que perduram. Segundo alguns, as pessoas mantém assim, um vínculo. Nunca se separam de verdade, porque nunca esquecem, ou se permitem esquecer por alguns instantes que algum dia passaram por isso e sofreram muito.
Continuamos conversando sobre isso. É um assunto complexo, com muitas formas de olhar. Há todas as histórias dos pais e mães envolvidas, às vezes extremamente sofridas. Mas, sempre me pergunto: como podemos melhorar nossas formas de nos separar? Será que é transformando nossas formas de amar?

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Falando de amor...

Amor e separação. Daqui a alguns dias estarei coordenando alguns encontros sobre o tema relações amorosas. Em algum momento, pensando sobre o tema, pensei: Nossa! Trabalho há tantos anos com divórcios e separações, com seus desdobramentos nada amorosos. Realizei grupos por mais de dez anos sobre o tema da separação conjugal. Ainda os realizo. Fiz dos grupos e das conversas, nas quais acredito tanto como forma de transformar relações conflituosas e belicosas em mais possíveis, o tema do meu doutorado. Nunca falei de amor, pensei! Só de desamor. Por que cargas d’água, de repente, vou conversar sobre amor?! E, é impressionante, como quando nos acostumamos a ver as coisas de um jeito, elas ficam desse jeito. Vou explicar: Hoje chego ao consultório de manhã. Depois de três clientes, todas vivendo ou tendo vivido um processo de separação, cada um com suas características. Totalmente diferentes entre si. Todos me emocionando profundamente em suas tentativas genuínas, do fundo do coração, do corpo e da alma, em busca de serem mais felizes de curar feridas, de lidar com os medos e seguir em frente. De recuperar coisas, restaurar, retomar a vida. Foi aí que uma luzinha (óbvia e nova ao mesmo tempo) me apareceu. Ela já vinha me cutucando há algum tempo, senão, não teria pensado em conversar sobre amor tão publicamente. Realizei que sim, falar de separação é sempre falar de amor. Parece óbvio, não? Afinal, estamos falando de um amor que acabou, da dor do amor desfeito, dos amores entre pais, mães e filhos que tentam arrumar um lugar para existir. Mas, não é só disso que estou falando. Ao conversar com essas pessoas, e com tantas outras e comigo mesma, percebo que nos separamos de maneiras muito parecidas com as maneiras que amamos. Há tantos tipos de amores, tantos mitos que inadvertidamente vivemos sem pensar. Há tantas intenções de amar que se tornam armas em guerras eternas. Todas as pessoas que passam pela minha vida, no consultório ou não, falando de suas dores e em suas separações, desejam muito o amor em suas vidas. Desejam encontrar outros amores, mas também desejam aprender a viver o amor. A relacionar-se amorosamente. Para isso, precisam superar muitas e muitas coisas que se misturam e confundem com amor, que chamamos tantas vezes de amor. Precisam perdoar a si e a outros por tudo que foi feito em nome de um amor. E aí, é que fica a pergunta sobre a qual gostaria de me debruçar: quando falamos de amor, ou melhor, quando vivemos o amor, o que realmente importa? Aliás, o que é isso que chamamos amor? Não é um enigma, embora eu ache que essas perguntas não têm respostas simples. Mas, o fato de fazê-la, me remete a uma sensação ainda difusa de que é necessário começar retirando disfarces, vendas, adereços, entende?



segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Redivivos os bem idos

Minha colega de blog me pergunta sobre o que fazer sobre os amigos do casal separado. Comentei que amigos ficam ao lado. Que lindo e socialmente desejável, né? 

Reflito um pouco mais e respondo com o fim que dei aos amigos de minha ex-parceira. Enterrei a todos! Os próximos, a família, os colegas, os afins. Tear down the wall! Sepultei-os! A todos, ou quase todos. Adeus aos que tinha intimidade, aos chegados, aos solidários. Terra neles! Sete palmos. Um luto que mais cedo ou mais tarde, deles necessitei vestir. O negror do esquecimento, o preto do nada.


Vida que vem, minha ex-companheira me chama a seu "cumple años". De uma tacada vejo a muitos. À ela, aos seus, aos ex-desafetos,, ao rival. Beijo e abraço à minha linda enteada, aos afins, às queridas, a quem afetei e a quem me disse algo.


Incessante, arrebatou-me uma alegria sem fim. Uma euforia, um crescer do coração. O rever, ver de novo, com os mesmo olhos, talvez um tanto mais cansados porém menos míopes. Pessoas caras demais. E se deixasse a mente por si, era como se nada tivesse se passado. Só que havia também a tristeza limitante. A perda, o nunca mais, esse cruel obsediante. Um sentimento misturado que duas doses ajudaram a digerir.

Fui desenterrando. Um a um. E já não havia pranto para mortos reviventes. Como chorar à vida? Mesmo que esta cheire a caixão? Cada qual foi me ocupando seu lugar. Efemeramente, eu intuía. O amanhã, a cidade, a correria e a distância comeriam o reencontro.

O porvir os verá longe novamente. Mas naquele tempo, eram todos de novos meus. Amigos, parceiros, perfilados a meu lado na batalha diária. Ressurrectos, refaziam-se como parte de minha vida. Não aquela antiga que um dia foi e há muito partira. Mas o exato momento ora vivido. Féretro aberto,  o frescor do afeto exalou e expandiu minha compreensão. Foram importantes no passado, e o que nos houve reverbera até hoje em minha existência. Sigo flanando até que a encontro dançando seus antigos passos. Feliz a trilhar a mesma estrada. Erros repetidos em novos acertos. 

Uma voz me expulsaria de lá mas não sem antes obrigar-me a ouvi-la:
"Não restará pedra sobre aqueles que possuam o dom de submergir em si, de enterrar seus mortos. Eis que chegará a 25a hora. Tocada será a sétima trombeta! Saiam de suas tumbas todos os crentes na vida eterna. Apocalypse now. Redivivos os bem idos."

Estanco em um átimo e expando essa compreensão para outros falecidos. Da orfandade à parricidade. Contrito, encaminho os insepultos ao fogo. Compreendo o imperativo de se fechar portas, dar-lhe o nó. Encerrar a meada. Para que ela não nos consuma em zumbis.